10 de abril de 2013

Voltando para casa...



Fim de tarde. Ônibus abafado e pessoas se aglomerando ainda mais. Trabalhadores exaustos e suados, estudantes carregados de papeis, uma mãe equilibrando sua criança de colo no vai-vem do corredor, duas adolescentes rindo alto, um senhor idoso com dificuldade para subir a escada do veículo, o cobrador impaciente: "Um passinho à frente, pessoal!"


No ônibus, mesmo que não se tenha intenção, é impossível não ouvir o que as pessoas conversam. Não há espaço nem para a discrição.
Foi aí que percebi que uma moça, no assento atrás de mim, falava ao celular. Não sei com quem ela conversava, mas estava animada e disse: "Tô voltando pra casa!" E essa frase, ouvida sem querer, ficou acelerando nas curvas do meu pensamento. A moça vinha não sei de onde e estava voltando para casa. Será que ela se dava conta do privilégio que isso significa? Passei a arquitetar hipóteses: ela devia estar falando com a mãe, que a esperava com o jantar pronto. Ou com o pai, com quem ela tomaria chimarrão à tardinha. Ou com o namorado, com quem fazia planos de casamento. Ou, quem sabe, ela falava com o filho pequeno, que pedia auxílio na lição de casa. Não importa. A moça voltava para casa.


Eu, no ônibus lotado, era como se estivesse dentro de uma vitrine em movimento. Lá fora, numa calçada de nossa cidade, uma pessoa solitária revirava uma lixeira. Buscava comida? Alguns metros adiante, uma criança descalça e sozinha estendia a mão ao motorista parado na sinaleira. Muitas pessoas nas ruas, rostos sérios e passos apressados. No assento, atrás de mim, a moça que voltava para casa, feliz.


Voltar para casa, para a família, para junto de quem se quer bem, é um privilégio da maioria das pessoas, mas não de todas. Há muitas que voltam, todos os dias, para lares desestruturados, para relacionamentos ressecados, para a solidão fria de suas casas. Mesmo convivendo com outras pessoas, sob o mesmo teto, são estranhas entre si. Não há diálogo, só monólogos. Não há partilha, só egoísmo faminto. Não há sorrisos, nem gentilezas; só reclamações e palavras duras. Não há pontes, apenas muros cada vez mais altos. Mães e pais sem tempo para os filhos. E filhos ditadores, ingratos. Avós que não têm para quem contar suas histórias. Resignados, vivem presos ao passado, em que as famílias numerosas ainda se reuniam, pelo menos para o farto almoço de domingo, quando se alimentava o corpo e o coração. 

Voltar para casa, voltar para a família todos os dias deveria ser sempre motivo de alegria, como o era para a moça que falava ao celular, com um sorriso na voz. Ou como na parábola de Jesus, que fala do retomo do filho perdido para os braços de seu pai bondoso. Família, casa, lar deveriam ser sempre sinônimos de aconchego, de partilha, de proteção. E isso apesar das diferenças, já que, mesmo na família, as pessoas são únicas, felizmente. 

Pela janela do ônibus, vi ainda um joão-de-barro no topo de um poste, engenhando sua morada, faceiro. Até ele! Então me dei conta do privilégio que é, também para mim, poder dizer: Eu estou voltando para casa!


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